quinta-feira, 24 de fevereiro de 2011

O diretor não é o dono do grupo!

     O diretor não é o dono do grupo, isso é simples, mas para pessoas que não fazem parte do meio teatral o diretor será o dono, isso não se criou da noite para o dia, foram durante décadas e até hoje as ditaduras de diretores em Cias teatrais, na maioria das vezes resumindo atores a simples marionetes, "Dario Fo" exemplifica isso em seu livro "Manual mínimo do ator": 


      " Subi ao palco e o cobri de elogios: 'Bravo! estupendo! Você entendeu inteiramente o jogo implícito em cada cena de denúncia impiedosa à lógica do poder, especialmente a menção histórica ao personagem de   Ana Bolena com suas manobras criminosas, de política torpe, sugerindo, inclusive, o tempo presente, pleno de crueldade, infâmia e cinismo. Felicito particularmente sua atitude de submissão, a postura quase curvada diante de sua mulher, Lady Macbeth. Existiu também um bom trabalho de entendimento do diretor'... o famoso e extraordinário ator observou-me com os olhos arregalados:
     'Quando?'
     'Como assim quando?'
     ' A alusão à realidade histórica... Eu curvado, submisso à Lady Macbeth... Isso tudo aconteceu em que momento?... Você está completamente equivocado, eu nunca tive essa intenção.'
     'É claro que você teve! Vê se tão bem!'
     Nesse instante, como um bom fanático, comecei a mostrar-lhe todas as passagens alusivas que eu havia percebido tão claramente. revelei-lhe todas as situações paralelas, as referências, até mesmo as óbvias, que não precisavam ser evidenciadas, pois levitavam por si mesmas do texto. Demonstrei-lhe como uma passagem tinha sido propositadamente cortada para o desenvolvimento de outra. quando eu estava no ápice da empolgação, escutei a voz tonitruante do diretor, revelando um sério antagonismo para com a minha pessoa: 
    'Eu te mato Dario!'
    'Por quê? o que foi que eu fiz?'
    'Venha comigo - sussurrou em meu ouvido, carregando-me para longe do ator - agora como é que eu fico?'
    'Não estou entendendo.'
    'Você está louco! Você revelou-lhe o que ele estava fazendo, deixando-o em crise! Amanhã ele não vai conseguir dizer mais nenhuma palavra com sentido lógico!' "¹


     Esse trecho deixa claro essa questão de mesmo atores considerados bons costumam ser manipulados, muitas vezes se rebaixando ao nível intelectual de micos amestrados, os diretores os deixam a parte de toda questão ideológica do espetáculo, tomam todo o controle como antigos donos de circo que tratavam animais e artistas quase do mesmo modo.
     Quando perguntamos o que se precisa para acontecer teatro, a resposta na maioria das vezes é ator e platéia e em alguns casos de teatro ritual até a platéia desaparece se tornando todos atores. Hoje estamos em outros tempos a cada vez mais grupos que pregam a descentralização do poder do diretor em um grupo de teatro, processos de montagem como o "Processo de criação coletiva" extingue quase que totalmente a figura do diretor teatral descentralizando as funções para todo o grupo, tornando o processo anarquista onde não se encontra um dominador teatral que impõe seu ponto de vista como imutável e temos também o "Processo colaborativo" onde apesar da volta da figura do diretor teatral dentro do grupo essa figura não tem mais o poder que tinha antes e as funções são flutuantes podendo ser mudadas de acordo com espetáculo, todos que se sentirem capazes podem pleitear o cargo de diretor ou qualquer outro dentro do grupo,nesse processo o diretor não manda manda nas funções dos outros como iluminação por exemplo, ele pode propor mudanças, mas não impor sua vontade ele manda tanto no grupo quanto o cenógrafo, o ator, o sonoplasta e qualquer um que participe do processo.
    Mas qual é realmente a função do diretor? Muitos chamam o diretor de primeiro espectador, o trabalho dele é assegurar a qualidade teatral, conjugando todos os esforços da equipe, incentivando a produção, trazendo propostas para criação de cenas e junto com o dramaturgo pensando as uniões textuais e de cenas para construção do espetáculo.


1- FO, Dario. Manual mínimo do ator. ed Senac, pag 104





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